quarta-feira, 19 de março de 2014

Um contributo para colocar o mar e as pescas na agenda política

Sem imaginar ou adivinhar que por estes dias aquela que tem sido uma preocupação minha e do CDS-Madeira, estivesse como está agora na agenda política da Região. Fico satisfeito por ver que o nosso trabalho na Assembleia Legislativa da Madeira começa a surtir algum efeito, provocando por parte de quem Governa a Madeira e tem a tutela destas áreas, já algum acordar para a realidade, face a inercia em que ao longo de praticamente uma década deixou o sector ficar.

Mas sejamos honestos, o Governo Regional só muda de atitude, quando vê o CDS-Madeira preocupado com o que se passa nas pescas e procura chamar a atenção da opinião pública para esses problemas. Isso que fique bem claro.

Deixo aqui, para quem quiser ler aquele que foi o meu discurso sobre as necessárias políticas ligadas ao mar e as pescas, que apresentei na passada quinta-feira dia 13 de Março, cujo principal objectivo é o de ser um contributo para colocar o mar e as pescas na agenda política e pelos vistos conseguimos.

Fica aqui então:


Sr. Presidente
Sras e Sres Deputados

Ao Longo dos últimos anos temos vindo a assistir a um retorno claro do País aos sectores produtivos, em especial a um retorno ao mar na agenda política, para o que contribuiu um conjunto de iniciativas públicas europeias e nacionais, como a Agenda Marítima para o Crescimento e o Emprego, a Iniciativa CE “Crescimento Azul – oportunidades para o crescimento sustentável nos sectores marinho e marítimo”, estes da responsabilidade da Comissão Europeia e a Estratégia Nacional para o Mar, do Ministério da Agricultura e do Mar.

De facto Portugal é um País que em termos da sua grandeza marítima é enorme e cujos arquipélagos dos Açores e da Madeira ganham uma importância única, pois estendem a própria União Europeia para o interior do espaço Atlântico, com fortes mais-valias económicas pouco potenciadas até aqui.

Os documentos estratégicos anteriormente referenciados, referem que a economia do mar já dá trabalho em Portugal, a mais de 100 mil pessoas e que a riqueza produzida anualmente pelo sector ultrapassa os 8.000 milhões de euros, sendo que no futuro próximo se prevê ainda um incremento da contribuição directa do sector do mar em cerca de 50% para o crescimento da economia nacional, que se espera venha a corresponder até 2020, a valores superiores a 4 ou 5% do PIB.

Entre este posicionamento geoestratégico importante e a heterogeneidade dos recursos a explorar dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, que são aquilo que muitos já consideram a fachada Atlântico-Mediterrânica da plataforma continental europeia, há um conjunto muito basto de potencialidades e oportunidades que devem ser identificadas e trabalhadas para gerar nestas regiões também maior sustentabilidade económica e menor dependência externa.

Portanto o futuro destas duas Regiões Autónomas Portuguesas também passa sem sombra de dúvidas por mais conhecimento sobre os seus recursos marinhos e marítimos ao seu dispor e das capacidades em saber aproveita-las no futuro de forma racional e sustentada.

No tocante a Madeira, no nosso entender importa claramente mudar de rumo.

Não podemos continuar como até agora a olhar para as actividades ligadas ao mar, de costas voltadas para o mesmo, ou como um conjunto de actividades económicas irrelevantes ou residuais, ao qual se dê pouca atenção, quando na verdade parte do nosso futuro em termos económicos passa claramente por assumir a importância destas actividades, numa logica de criação do chamado “Cluster do Mar”, que certamente poderá ser importante para desenvolver um conjunto de actividades que embora distintas se tocam e geram no seu conjunto riqueza importante, a qual não podemos continuar a desprezar como até agora.

A região tem de rapidamente ultrapassar o declínio que se assiste também nas pescas, pois se olhar-mos aos dados da Direcção Regional de Estatística de 2012, verifica-se que o sector continua em profundo declínio, a perder mão-de-obra, que passou de 476 pescadores em 2011 para 429 em 2012. Sendo que a estes dados importa acrescentar o fraco valor económico que a actividade representou, na ordem dos 12,7 milhões de euros e as quebras na captura do peixe-espada-preto, que sendo uma das principais espécies da nossa pesca, esta representou menos 11,6% relativamente ao ano anterior e no valor comercializado na primeira venda também de menos 9,6%, sendo que no preço médio ficou-se pelos 2,20 euros, quando em 2011 ando na casa dos 2,43 euros, o que representou também uma diminuição no rendimento dos pescadores de menos 9,8%.

De facto no tocante a frota espadeira o que se tem vindo a assistir é grave e muito preocupante, pois a evolução é negativa desde 2006, caminhando desde então de forma acelerada para a sua extinção.

Em sentido contrário, a pesca dos tunídeos tem tido altos e baixos nos últimos anos, mas o balanço embora sendo melhor que o da frota espadeira, merece da nossa parte também a nossa melhor atenção, pois está longe da estabilidade mínima desejada pelos homens ligados a esta pesca e da capacidade económica que pode também gerar.

Na aquicultura, a produção tem vindo a crescer significativamente atendendo que esta é uma actividade relativamente recente na região, mas que mesmo com números considerados bons, representa face ao seu potencial, valores aquém dos que pode atingir, que em 2012 se cifraram apenas nos 1,6 milhões de euros.

Infelizmente o anterior PROMAR – Programa Operacional de Pescas, no período 2007-2013, foi uma oportunidade perdida, no que a instrumentos financeiros e de orientação das pescas poderia ter sido, para reestruturar o sector na Região. Ao contrário do que se objectivou, acabamos este período sem a competitividade e a sustentabilidade pretendidas, tal como a inovação neste sector que também nem sequer se chegou a esboçar.

E tendo em conta também os próprios dados do Governo Regional no PIDDAR e no Orçamento da Região para o presente ano, o conjunto dos sectores produtivos (Agricultura e Pescas), continuarão a perder peso na economia regional, sendo infelizmente sectores a continuar marginais, representando pouco mais de 1%, situação que se arrasta como já referido desde 2006.

Para tudo isto contribuiu decisivamente os objectivos estratégicos definidos para o período de 2007 – 2013, em que a Região negociou através do Governo da República com a Comissão Europeia instrumentos financeiros e de orientação das pescas, que pretendeu garantir uma exploração sustentável dos recursos aquáticos vivos, aceitando e promovendo planos de ajustamento do esforço de pesca local, nomeadamente do peixe-espada-preto, que passava basicamente e erradamente pelo abate de embarcações.

Assim em Janeiro de 2009, entra em vigor o primeiro desses planos que pretendia a redução de 55% das embarcações licenciadas, que passados dois anos não foi totalmente concretizado.

Posteriormente a Região elabora em Junho de 2012, um segundo plano de ajustamento do esforço de pesca do peixe-espada-preto, que pretendia a concretização integral do objectivo inicial de abate de embarcações, sustentado em indicadores que tal como em 2009, apontavam para a necessidade imperiosa de dar-se continuidade à adopção de medidas de conservação desse importante recurso pesqueiro da região e do ajustamento iniciado, que o Governo Regional acreditava ser um esforço necessário para a renovação biológica do recurso explorado.

Mesmo com quebras brutais de peixe pescado neste período e com o aparecimento de estudos que evidenciavam características migratórias da espécie, os objectivos mantiveram-se inalterados, sendo o Governo Regional indiferente aos alertas dos armadores e dos pescadores que alertavam já para as consequências desastrosas destas políticas.

Infelizmente o sector das Pescas é aquele que findo este período de restruturação e de apoio comunitários, atravessa as maiores dificuldades estruturais das últimas décadas em boa parte pelo seguimento de políticas erradas de ajustamento do esforço de pesca que na frota do peixe-espada-preto, como vimos implicou o abate considerável de embarcações, supostamente para obter um equilíbrio estável e duradouro da espécie que afinal não se veio a confirmar, agudizando-se sim, os problemas do sector e a sustentabilidade futura do mesmo e da espécie. 

O tempo demonstrou que o caminho acordado pelo Governo Regional, com o Governo da República e as entidades de Bruxelas não foi o melhor, pois infelizmente outras frotas europeias, nomeadamente a francesa reduziram drasticamente o stock de indivíduos a pescar com a pesca de arrasto, visto que a espécie por ser migratória na sua passagem por outras águas tem perdido aos poucos a sua capacidade de reprodução com a captura indiscriminada.

Embora se assista hoje a uma clara tentativa de fazer esquecer estas políticas regressivas e se observe a habitual “culpa dos outros”, a verdade é que as medidas foram aceites por quem tem governado a Região em 2009 e ratificados em 2012 tendo conduzido à perca de rendimento e desalento a armadores e pescadores.

Importa hoje olhar para o futuro e trabalhar no sentido de inverter o declínio da actividade e da espécie que hoje se assiste. Tudo deve ser feito para devolver ao sector a pujança de outros tempos, numa actividade que foi sempre importante para a economia de toda a região. Assim importa que se possa reintroduzir no período de 2014-2020, apoios financeiros à construção, renovação e à modernização da frota de pesca espadeira da região, de forma evitar o acentuado envelhecimento da frota e por conseguinte que esta venha acabar por desaparecer.

A par disto importa desenvolver ainda mais, actividades de investigação, a par de outras de inovação tecnológica, no âmbito do apoio técnico-científico a pesca da Região, numa perspectiva de promoção e desenvolvimento sustentável da pesca artesanal, que é menos agressiva.

Promover e melhorar a qualificação dos profissionais do sector, envolvendo-os na gestão dos recursos.

Importa também rever os apoios aos factores de produção, nomeadamente as compensações financeiras ao preço do gasóleo utilizado pelas embarcações de pesca e de aquicultura que estão desadequados face a realidade económica e fiscal que a Região vive.

Para além disto é inadiável encontrar novos meios financeiros que compensem os anteriormente desperdiçados, que permitam a modernização das estruturas existentes de lota, entreposto frigorífico e de armazenamento na Região, que passará certamente pela construção do Porto de Pesca de Câmara de Lobos, prometido a imenso tempo e sucessivamente adiado, mas que incompreensivelmente ainda não tem pelos vistos um projecto e que sem sombra de dúvidas é uma infraestrutura vital para o futuro da região.

Assim sendo e face a importância estratégica deste sector para a Região Autónoma da Madeira, o CDS-Madeira tal como tinha prometido submeteu já a esta Assembleia um conjunto de Projectos de Resolução que abordam estas questões, dando sequência as conclusões que retiramos dos encontros que temos vindo a ter com armadores e pescadores e das audições que se fizeram ao Secretário do Ambiente e Recursos Naturais em que se analisou por propostas também nossas as dificuldades sentidas pela frota espadeira e o acordo Canárias-Madeira.

É nossa obrigação continuar a dar importância e chamar atenção da maioria e do Governo que suportam para a importância deste sector para a economia regional, hoje subaproveitada como sabemos. É importante que este tema continue vivo na opinião pública, pois é fundamental que os Madeirenses percebam a importância do sector para o futuro e sejam também estes os impulsionadores das necessárias mudanças que também neste sector produtivo importa promover.

Da parte do CDS-Madeira, continuaremos também disponíveis a consensos que sejam necessários no âmbito parlamentar cá na Região e em Lisboa, para fortalecer a posição da Região junto do Governo da República e da União Europeia. Não seremos nós os que por falta de sentido de Estado e de espírito democrático a inviabilizar esses desejados e necessários acordos que tornem forte a posição da Madeira. Também na forma como tratamos destes dossiers somos diferentes, somos mais responsáveis.



Tenho dito!


Imagem: Google

Sem comentários: