Criação de cavalos no centro de Lisboa - mesmo que um dos animais fuja, como aconteceu na madrugada da passada terça-feira - ou o rebanho que cruza uma aldeia entre o redil e a pastagem, passando pelo meio dos moradores, têm um significado muito semelhante para o arquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles: "São as nossas origens agrícolas, que, infelizmente, estão tão esquecidas. A agricultura urbana deveria ter integração obrigatória no planeamento urbano, e o gado e a pastorícia são peças fundamentais nesse processo", alerta.
Segundo Ribeiro Telles, Portugal regista um "atraso secular" nesta matéria, o que está a provocar, garante, o despovoamento das aldeias e consequente procura dos subúrbios das grandes cidades, com elevadas concentrações humanas.
Segundo Ribeiro Telles, Portugal regista um "atraso secular" nesta matéria, o que está a provocar, garante, o despovoamento das aldeias e consequente procura dos subúrbios das grandes cidades, com elevadas concentrações humanas.
Loures e Estoril, onde ainda resistem alguns pastores, depois de debandada geral das últimas décadas, são exemplos de desertificação apontados pelo arquitecto às portas de Lisboa. "Embebedamo-nos com problemas como o TGV, sem nos apercebermos da gravidade em que caiu o nosso abastecimento", insiste, defendendo que os animais domésticos "têm de ter cabimento nas nossas cidades, vilas e aldeias".
E não interessa se são "cavalos, ovelhas, galinhas ou porcos". Nem tão-pouco se atravessam aldeias, estradas ou cidades. "Os animais dão vida, porque uma terra que tenha animais, tem pastoreio, tem casas habitadas, tem escolas e futuro. Hoje só vemos velhos nas aldeias, escolas fechadas e os caminhos por onde o gado passa totalmente destruídos. Estamos a criar um deserto para viabilizar a monocultura industrial do eucalipto e do pinheiro", lamenta.
Para Ribeiro Telles, não é por acaso que as universidades americanas há muito que debatem o problema da agricultura urbana, que começou a disseminar-se por toda a parte. "É triste, mas nós não conhecemos nada desta realidade. Há quem defenda que a cidade e Lisboa não comporta vegetação e agora até há o perigo de aparecerem as casas ecológicas com telhados cobertos de plantas para haver mais espaço para construção em massa", diz o especialista.
O arquitecto admite que o debate em Portugal sobre a recuperação do pastoreio nas cidades "está mais do que feito". Porém, dá um exemplo de como todos os argumentos têm caído em saco roto: "Quando se quer promover uma parcela de terreno, põe-se uma menina bonita ao lado", refere, lamentando que ninguém invista num outdoor com os utilizadores da paisagem, que seriam os pastores. Chegámos ao cúmulo de ver placas à beira da estrada afixadas nas melhores várzeas do país", aponta.
Fonte: DN-Lisboa
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