domingo, 1 de julho de 2007

Autonomia, História de Identidade

Hoje mais do que fazer uma reflexão pessoal sobre os 31 anos de Autónomia ou criticar a forma como ela foi comemorada, farei a publicação dum artigo de opinião publicado hoje no DN-Madeira do Historiador Nelson Veríssimo, que aborda um outro lado desta nossa Autonomia tão importante e ao mesmo tão esquecida, que do meu ponto de vista é a chave para a mudança no futuro, pois só conhecendo verdadeiramente o nosso passado é que é possível criar consciências dum passado, dum presente e perspectivar um futuro. Só assim é que as gerações vindoras poderão verdadeiramente conhecer esta nossa identidade madeirense, portanto falemos de História.

"Autonomia, História de Identidade


O Decreto Regional n.º 27/79/M, de 9 de Novembro, instituiu o 1.º de Julho como o feriado da nossa Região Autónoma, justificando-o como "o dia da descoberta da Madeira".

Verdade é que o arquipélago madeirense era já conhecido antes da chegada dos portugueses e encontrava-se cartografado, pelo menos, desde a segunda metade do século XIV, sendo estas ilhas já então designadas pelos actuais topónimos.

Tudo isto apenas significa que este grupo insular estava geograficamente localizado antes do povoamento português e que, com rigor, não se sabe quando os navegadores, ao serviço do Infante D. Henrique, aqui aportaram.

No entanto, no imaginário dos povos há sempre uma data para assinalar a fundação, que, forçosamente, não tem que condizer com dúvidas e incertezas dos historiadores. Assim sendo, a Região Autónoma adoptou, para o seu feriado, uma data que encontra algum fundamento na tradição, mas não na moderna historiografia.

De facto, o nosso primeiro cronista, Jerónimo Dias Leite, escrevendo por volta de 1579, registou a chegada dos portugueses à ilha da Madeira no dia 1 de Julho de 1419. Todavia, outras fontes contrariam esta data. Por agora, e neste contexto, não interessa continuar a discussão.

Importa, antes, realçar que a Região Autónoma da Madeira, através dos seus representantes, democraticamente eleitos, se baseou na História para comemorar o seu dia. Na verdade, História e Autonomia sempre caminharam lado a lado.

Na Constituição de 1976, por exemplo, fundamenta-se o regime político-administrativo próprio dos arquipélagos dos Açores e da Madeira nos condicionalismos geográficos, económicos e sociais, mas também nas históricas aspirações autonomistas das populações insulares (art. 227.º). Foi, porém, mais claro, e mais longe, o legislador em 1999, no Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, ao acrescentar, àqueles condicionalismos, a componente cultural e ao mencionar que as históricas aspirações autonomistas são do seu povo, isto é, dos madeirenses e porto-santenses (art. 4.º) Se para a instituição da autonomia regional é reconhecida a importância da História e se esta constitui elemento determinante da identidade cultural de uma região, que importa consolidar, a divulgação do conhecimento do passado histórico destas ilhas representa, portanto, um forte imperativo.

Contudo, não se divulga a História da Madeira apenas com congressos de reputados especialistas, edições de actas, teses, colectâneas documentais ou álbuns ilustrados, mais ou menos aprimoradas graficamente, embora se reconheça inestimável valor a estas iniciativas.Já há muito que se sente a necessidade de ir mais longe e colocar o saber, de forma simples e concisa, ao alcance dos não especialistas, mas que, minimamente, se interessam pelo conhecimento das suas raízes e da sua região.

Em Abril de 1997, correspondendo ao Programa do Governo Regional de então, procurou-se reunir especialistas de diferentes áreas para a elaboração de um 'Novo Elucidário Madeirense', na sequência de uma tentativa debalde anteriormente feita, e que, se não me falha a memória, ocorreu no primeiro semestre de 1983.

Sem conseguir surpreender, o Velho do Restelo, que sempre se paramenta para estas ocasiões, acenou com um 'Dicionário de História da Madeira', em curso, e, com êxito malfazejo e inaudita conivência, sufocou tão generosa ideia e projecto governamental, temendo sombra na sua capela.Passados dez anos, nem um 'Novo Elucidário Madeirense' nem um 'Dicionário de História da Madeira', com prejuízo cultural desta Região Autónoma.Sem uma obra de fácil consulta para esclarecimento actualizado de diferentes matérias deste arquipélago, persiste, por conseguinte, o velho 'Elucidário Madeirense' como obra de referência para muitos, sobretudo estudantes, ainda que, nalgumas entradas, se revele, nitidamente, ultrapassada pelos numerosos contributos das últimas seis décadas nos vários ramos da investigação.

Esta realidade atesta, porém, da virtude daquele projecto editorial, propositadamente concebido para assinalar o quinto centenário do descobrimento do arquipélago da Madeira, no início da década de vinte do século passado, e que foi elaborado, com esmero, pelo Padre Fernando Augusto da Silva e Carlos Azevedo de Meneses."


Nelson Veríssimo

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